Aspectos Históricos
A expedição de Martim Afonso de Souza a São Vicente em 1532 pode ser considerada o ponto de partida para a indústria açucareira no Brasil. A produção regular de açúcar na colônia só poderia se desenvolver com a fundação de uma vila, a de Martim Afonso de Souza, donatário da Capitania de São Vicente, considerado pioneiro na colonização do Brasil. Ele foi responsável pelo lançamento das bases da ocupação da região, criando uma infraestrutura que permitiu a fixação dos portugueses no território. Além de doar sesmarias e construir fortalezas, introduziu o cultivo da cana de açúcar na capitania, levando à construção de um Engenho.
Dentre as unidades produtoras de açúcar, destacamos o outrora denominado Engenho do Governador, posteriormente “dos Erasmos”, quando adquirido pela família Schetz de Antuérpia.
O Engenho dos Erasmos tornou-se propriedade dos Schetz por intermédio do flamengo Johan Van Hielst ou João Veniste que, desempenhando a função de representante comercial da família, contraiu sociedade com Martim Afonso, Pero Lopes de Souza, Francisco Lobo e Vicente Gonçalves em 1533 (os acionistas desta companhia chamavam-se ‘Armadores do Trato”). Nesta época o governador da capitania objetivava arrecadar recursos para levantar o dito engenho que seria construído em 1534.
A sociedade desfez-se quando Martim Afonso viajou para as Índias e seus sócios negaram recursos para dar continuidade aos investimentos na manufatura açucareira. Van Hielst permaneceu no empreendimento mas, em 1540, as outras partes foram compradas por Erasmos Schetz, que alguns anos mais tarde incorporou o que cabia a Van Hielst.
Originários da Franconia ou Aachen, atual área de fronteira entre Holanda, Bélgica e Alemanha, os Schetz iniciaram suas atividades comerciais por volta de 1500, com a iniciativa do patriarca Coenraedt Schetz, pai de Erasmos.
Ainda no primeiro quartel do século XVI, Erasmos Schetz aparece como fundador de uma empresa em Leipzig. Seus negócios na Alemanha envolviam uma casa bancária, seguros marítimos e minas de cobre e prata. Em seguida, suas atividades comerciais estenderam-se até Antuérpia, Bruxelas e Amsterdã. Os Schetz distribuiam seus produtos por toda a Europa e tinham ligações de caráter comercial com italianos, holandeses, franceses, portugueses, alemães, além da Companhia de Jesus.
Sem dúvida, o período de apogeu do Engenho São Jorge dos Erasmos como manufatura açucareira foi sob a direção da família Schetz. Os documentos da época colonial registram que esses negociantes flamengos fizeram várias tentativas de vender sua propriedade no Brasil entre 1593 e 1612.
O Engenho funcionou, segundo Paul Meurs, até o século XVIII. E, ao longo desse período, produziu cana para exportação, além de rapadura e aguardente para consumo interno no século XVIII. Ao longo desse século, porém, podemos constatar a decadência da propriedade. Para a produção de açúcar e derivados, além da fábrica propriamente dita, o Engenho comportava unidades administrativas e residenciais, inclusive dependências de escravos (senzalas). A documentação escrita revela, segundo Stols, que o engenho se compunha de “[…] uma casa muito grande com seis lanços, uma senzala com uma ferraria provida de baluartes e ainda duas casas cobertas de telhas, muito boas e fortes […] todas estas casas se erguem numa altura e todas juntas e próximas de maneira que nenhuma fazenda seja tão forte para os contrários.”
Existem divergências em relação à data em que o Engenho São Jorge dos Erasmos teria sido construído. Historiadores como Maria Regina da Cunha Rodrigues e Pedro Taques de A. Paes Leme apontam o antigo Engenho do Governador como sendo o primeiro da Capitania de São Vicente (1533). Francisco Martins dos Santos afirma que foi o segundo (1534-35) e Basílio de Magalhães e Paul Meurs acreditam que o Engenho dos Erasmos foi o terceiro empreendimento desse tipo a ser construído na região.
Em 1943, os terrenos com as ruínas foram adquiridos por Otávio Ribeiro de Araújo, que loteou a propriedade e doou o Engenho São Jorge dos Erasmos à Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, no ano de 1958.
Em 1958, Luís Saia, chefe do 4º Distrito da Diretoria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, órgão federal, relatou ao presidente da Comissão Especial do Engenho São Jorge dos Erasmos que realizou prospecção e definiu o partido arquitetônico como de “modelo açoriano, tipo real e movido à água”. (Saia, 1958). No entanto, é importante salientar que o engenho é o único exemplar que restou em território nacional, como testemunho dos tempos em que a indústria açucareira era o produto essencial nos negócios e na economia da colônia.